terça-feira, 18 de dezembro de 2012

O que vem depois da triste notícia?


Desde o primeiro momento em que soube que perdi o bebê, lembrei-me da minha mãe e de tantas outras mulheres da minha vida – ou de fora dela – que passaram por isso. Eu estava descobrindo, naquela hora, como era essa dura sensação, que tantas vezes tentei imaginar enquanto estava grávida. Ela é única. Só quem vive conhece. E foi assim que eu tentei encarar as coisas: eu e meu marido estávamos entrando para o grupo de pessoas que passarão pela vida tendo experimentado essa dor. Só isso. Depois, seremos tão felizes, bem sucedidos em outras gestações e realizados quanto todos os outros papais do mundo. Só nisso eu pensava.

Na recepção da clínica, diante de todas aquelas barrigudinhas que aguardavam para ver seus bebês na tela da ecografia, a espera pela impressão do laudo médico pareceu uma eternidade. Ficamos ali, em pé, esperando o documento. Eu tentava segurar as lágrimas, para não impressionar aquelas mamães que tinham seus bebês vivos dentro de si. Não queria despertar nelas qualquer agonia relacionada a perdas. Eu já tinha me torturado o suficiente com aquilo. O laudo chegou e descemos os quatro andares do prédio pela escada de emergência – tudo para fugir de pessoas, elevadores ou qualquer outro lugar onde teríamos que continuar disfarçando a tristeza. Só lá, na saída de emergência, nos abraçamos e choramos.

Senti como se estivéssemos numa bolha escura. Ao redor, todos ainda viviam felizes pela notícia do novo bebê e, dentro da bolha, só nós sabíamos que ele não viria mais. Mas infelizmente era preciso acabar com a festa e avisar isso aos avós, titios e amigos que já o esperavam, já “falavam” com ele, já enviavam presentes. Mas antes liguei para o obstetra e perguntei: por que não sangrei? por que o bebê tem tamanho de sete semanas, se estou de dez? por que isso aconteceu? Ele me explicou tudo. Disse que tive um aborto retido, por isso não sangrei. Que o neném parou de se desenvolver, por isso a variação entre tempo e tamanho. Que isso pode acontecer com qualquer gestante, a qualquer tempo, em qualquer idade.   

Aí liguei para minha mãe, mesmo sendo 8h30 de sábado. “Mãe, meu neném achou que esse mundo estava muito virado e não quis vir agora”. “Oi?” - ela não entendeu nada do que eu disse, por causa do choro. “É mãe, ele não vem”. “O que foi filha?”. “Meu neném não vem, mãe!”. “Filha, você perdeu o neném?”. Sim. 

Leia também: Aborto retido: esperar o organismo expelir ou já partir para a curetagem?

Pressentimento, medo da perda ou pessimismo?


Quando descobri que estava grávida, em outubro, explodi de tanta felicidade! Quis anunciar ao mundo que seria mãe, quis ver a surpresa no rosto do meu marido, quis fazer meus pais felizes com a notícia. Até consegui segurar a onda por alguns dias – afinal, começo de gravidez é sempre delicado e eu estava de apenas três semanas –, mas em pouco tempo todos já estavam sabendo. O que não significa que eu não tivesse medo de perder o bebê. Claro que isso passou pela minha cabeça, muitas vezes, muitas mesmo. E até hoje fico na dúvida se passou mais do que deveria...  

No começo eram as cólicas das primeiras semanas. Depois as tristes histórias que eu lia na web. Vários episódios sobre perdas. Eu sabia dessa possibilidade e tinha muito medo dela. Mas sempre me acalmava o fato de não ter tido nenhum sangramento, em nenhum momento da gravidez.  O que mais me apavorava, na verdade, era sentir poucos sintomas da gestação. Meus seios estavam enormes, meu olfato e paladar aguçadíssimos, mas quase não tinha enjoos ou sono demasiado. Na verdade, não tinha desconforto algum. Seria isso um mal sinal? Pouco hormônio? “Besteira, eu nunca senti nada e deu tudo certo”, me diziam várias mamães conhecidas. Mesmo assim, eu ficava ressabiada.

O tempo todo eu procurava, na internet, artigos sobre como ocorrem as perdas no início da gestação. Descobri que a maioria acontece por volta da sétima semana e começa com sangramento. Eu não tinha sangramentos, então respirava aliviada (mas sempre com um pé atrás). Quando superei a sétima semana, comecei a acreditar mais que não entraria na estatística das perdas. Afinal, eu não tinha qualquer motivo para acreditar que minha gravidez não estava bem. Mas a pulga nunca saiu de trás da orelha. Todas me diziam “aproveite essa fase, pois passa muito rápido”. Mas tudo que eu queria era que os três primeiros meses passassem rápido mesmo, para ver se esse medo da perda diminuiria.  

Quando descobri a gravidez, meu bebê era apenas um “corpo lúteo”. A primeira ecografia foi na quarta semana e ele ainda estava se fixando, nem era considerado embrião. Apenas na próxima ecografia, dali um mês, eu poderia vê-lo melhor e ouvir seu coraçãozinho. Na véspera desse dia esperado, foi o meu coração que bateu apertado. Não sei se era o medo de receber uma notícia ruim, ou pressentimento de algum tipo. Na verdade estava tudo bem comigo, nenhum sangramento, nenhuma dor, mas eu sentia falta de perceber “algo mais”. Eu sei, claro, que não se sente o bebê nessa fase. Mas eu tinha a impressão de que os sintomas da gravidez estavam todos na parte superior do meu corpo (nos seios, no olfato, no paladar, na cabeça que doía).  É duro dizer isso, mas eu já não sentia vida no meu ventre, como senti nas primeiras semanas. Naquela noite fui dormir mais cedo, pois nada me desviava do medo da ecografia que viria e isso estava me perturbando. Nem a possibilidade de ouvir o coração do bebê pela primeira vez me distraía da preocupação. Perguntei várias vezes ao meu marido: “Será que está tudo bem com o bebê?”, “Será que esse bebê está bem?”.

No dia seguinte acordamos cedo, fomos para a clínica e ficamos aguardando na recepção. Enquanto conversávamos, eu disse a ele: “Não devemos providenciar nada para o bebê antes de completarmos três meses de gravidez. Tudo pode acontecer”.  Trocar de carro, de apartamento, comprar carrinho, cadeirinha, tudo deveria ficar para depois, na minha opinião. Chegou a nossa vez, entramos no consultório e já nos primeiros segundos da ecografia o médico parecia intrigado. Soltou frases soltas como “sete semanas?” – eu estava de dez –, “vamos ver o que aconteceu aqui...”, “hum...”, até que veio aquela inesquecível: “É, infelizmente não se desenvolveu”. Meu marido, que nunca tinha pensado na possibilidade de a gravidez não ir para frente, se desesperou. Eu engoli o choro, fiz meia dúzia de perguntas ao ecografista e fui me vestir. Para mim, todas as perguntas teriam respostas, menos uma: eu senti que perderia o bebê ou fui pessimista o tempo todo? Acho que nunca saberei... 

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sábado, 8 de dezembro de 2012

Perdi meu bebê, fiquei confusa e criei um blog

Há muitos anos pensei em ter um blog, mesmo achando isso trabalhoso e egocêntrico. Mas nunca consegui pensar exatamente no que dizer por aí. Não que eu fale pouco, mas há de haver um sentido maior, não? Até que neste ano, de 2012, tanta coisa aconteceu e isso me trouxe até aqui. Cá estou, ainda sem ter certeza se fará algum sentido levar a ideia adiante. Mas, felizmente, eu nunca tenho certeza de nada, então vamos experimentar...

Desde que fiz 30 anos, em 2011, o "sininho" da maternindade começou a bater na minha cabeça. Então eu e meu marido nos preparamos para isso e em outubro deste ano descobrimos que estávamos grávidos. Uma alegria que sentímos durante apenas 40 dias, até descobrir que o coraçãozinho do nosso neném havia parado. Foi muito triste, mas nos esforçamos para entender que boa parte das gestações realmente não vai para a frente e aceitamos o destino.

Porém, além de perder o bebê, continuo caindo em uma série de "exceções": tive um aborto retido, que meu organismo jamais expeliu; tive que usar medicamentos fortíssimos, que não fizeram o efeito esperado; tive que fazer uma curetagem, que não limpou meu útero por completo; e agora estou em mais uma etapa de tratamento que, no mínimo, ainda vai durar mais ou menos uns dois meses. Segundo meu médico, não é nada grave, que eu deva me preocupaaaaaaaar. Mas tudo isso colocou minha cabeça para funcionar a uma velocidade tão grande, que preciso organizar as ideias (e às vezes compartilhá-las, mesmo que seja com a "escuridão" de um blog).

Vieram sensações que eu simplesmente preciso colocar para fora, em algum lugar. E ideias que eu preciso dar um jeito de colocar para dentro da minha caixola. Não que eu concorde que um blog seja o espaço ideal para desabafar ou algo do gênero, tampouco que isso vá interessar a mais alguém. Mas porque em meio a toda essa história, após alugar por horas e horas os ouvidos dos meus amigos e familiares, passei a procurar também na internet espaços, histórias, palavras que me ajudassem. Raramente encontrei. A maior parte do que li mais me confundiu do que meu ajudou. Foi aí que concluí que eu jamais encontraria, pronto e embalado, o conforto que procurava. Pois cada caso é um caso e eu mesma vou ter que entender o meu.

E aqui vim, com meus devaneios, tentar decifrar a mim mesma por meio da escrita. Espero que a história que contei rapidamente nesse post - e pretendo detalhar melhor nos próximos - seja temporária e fique logo no passado. E que, se a experiência desse blog se mostrar interessante, eu possa continuar falando de outras coisas, outras histórias, outras dúvidas, mais curiosas, mais alegres, enfim. Se, por um acaso do destino, algo disso tudo um dia interessar a alguém, sua leitura e interação serão bem-vindos.

Leia também: Pressentimento, medo da perda ou pessimismo?

Cheguei!

Aqui estou eu. Acabei de chegar e ainda não tenho certeza a que vim. Na verdade, não tenho certeza de nada, e por isso vim... 

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